Quarta, 17 de Outubro de 2012 às 15:54

Comissão Nacional da Verdade endossa pedido para que USP reveja decisão que afirma que desaparecida "abandonou função"

cnv 171012No ato em que foi assinada cooperação entre a CNV e a Comissão Estadual da Verdade, em São Paulo, CNV recebeu vários documentos e pedidos de familiares de vítimas

A Comissão Nacional da Verdade e a Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva assinaram hoje à tarde em São Paulo um Termo de Cooperação. Pelo acordo, ambas as comissões, de acordo com seus mandatos, vão colaborar mutuamente em busca da verdade sobre as violações de direitos humanos nos períodos descritos na lei e resolução que criou cada coletivo, respectivamente. A CNV apura o período de 1946-1988 e a CEVRP, o de 1964-1982.

A Comissão Estadual vai investigar 140 casos de mortes e desaparecimentos ocorridos durante a Ditadura envolvendo vítimas paulistas ou ocorridos em São Paulo. Já a CNV emprestará seus poderes requisitórios sempre que preciso para que a Comissão Estadual possa concluir esta meta. Assinaram o acordo Rosa Cardoso, pela CNV, o presidente da Comissão Estadual, Adriano Diogo, e os deputados estaduais Marco Zerbini, Ed Thomas, Ulysses Tassinari e André Soares, membros efetivos do colegiado estadual, e João Paulo Rillo, suplente da Comissão Estadual.

No ato, a advogada Rosa Cardoso, membro da Comissão Nacional da Verdade, endossou ofício da Comissão Estadual da Verdade em que esta pede que a Congregação do Instituto de Química da USP e o reitor daquela universidade revejam decisão da congregação, de outubro 1975, em que foi aprovada a demissão da professora Ana Rosa Kucinski, desaparecida desde 1974 após ser presa pela ditadura, por "abandono de função".

Apesar de então reitor da USP, Flávio Fava de Moraes, em 1995, ter determinado o cancelamento da demissão de Ana Rosa Kucinski, mesmo ano em que a professora foi declarada desaparecida pelo Governo Federal, é preciso que o Instituto de Química reveja publicamente essa decisão da congregação de 1975, o que até hoje não ocorreu.

Após a assinatura do acordo, várias pessoas se manifestaram. Amélia Telles, representando a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, entregou à CNV cópias de três relatórios emitidos pelas Forças Armadas em 1993, respondendo requisição do então ministro da Justiça Maurício Corrêa. Apesar de os familiares reforçarem que há informações falsas ou difamatórias nos relatórios, eles consideram que neles "há informações importantes, que mostram que os militares detêm documentos com detalhes sobre as circunstâncias e características de cada uma das vítimas de torturas, assassinatos e desaparecimentos forçados".

Rosa Cardoso recebeu do Ministério Público Federal em São Paulo cópias de documentos do Dops e da Operação Bandeirante relativos à prisão e ao desaparecimento de Edgard de Aquino Duarte, cujo sequestro foi alvo de nova denúncia do MPF à Justiça Federal de São Paulo.

Também na mesma tarde, a sobrevivente do Araguaia, Crimeia Almeida, pediu à Comissão Nacional da Verdade um estudo sobre como podem ser retificados os atestados de óbitos dos desaparecidos políticos reconhecidos como mortos por agentes do Estado, de acordo com a lei 9140/95.

"Meu companheiro foi assassinado, mas, em virtude da lei (que resolveu a situação das famílias na esfera cível), foi como se colocassem uma pedra no assunto. O atestado de óbito dele não informa como, quando e onde ele morreu", afirmou.

Em outro momento, o jornalista Antônio Carlos Fon revelou que o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo enviará ao Procurador Geral da República e à Procuradoria Regional da República na 3ª Região (São Paulo) notícia-crime (representação) sobre os casos de violência policial no Estado e as ameaças a jornalistas que cobrem o tema. Já o Fórum Aberto pela Democratização da USP pediu que a Comissão da Verdade apoie a criação de uma comissão da verdade na universidade.

O pesquisador Marcelo Zelic, do Grupo Tortura Nunca Mais São Paulo, revelou alguns dados que descobriu sobre massacres de nações e grupos de indígenas durante o período do regime militar, entre os quais o bombardeamento de aldeias dos Waimiri-Atroari na rota das obras da BR-174 (Manaus-Boa Vista) e a descoberta de sete cadeias exclusivas para índios que teriam existido no país logo após a eclosão do golpe, para segregar índios que se opuseram a projetos desenvolvimentistas do regime.

REUNIÃO INSPIRADORA – "Foi uma reunião muito inspiradora, que nos trouxe um conjunto de questões para trabalhar na Comissão Nacional da Verdade. As certidões de óbito dos desaparecidos políticos, por exemplo, tiveram muito significado para os familiares, para as questões cíveis, mas criaram um problema que perdura, pois não houve o esclarecimento completo dos fatos. Isto só reforça que temos muito trabalho pela frente e a Comissão deve fazer uma reflexão sobre esse pleito das famílias", declarou.

Quanto aos massacres de indígenas na Ditadura, Rosa lembrou ao público presente que a Comissão da Verdade possui um grupo de trabalho específico para o tema, sob a coordenação de Maria Rita Kehl. "Ela revelou aos membros da Comissão a importância do tema e nos convenceu a todos", disse.

Sobre as violações de direitos humanos que hoje ocorrem em São Paulo e no restante do país, Rosa Cardoso reiterou o posicionamento que vários membros da Comissão da Verdade têm assumido publicamente: a de que a Comissão da Verdade, no relatório final, analisará as violações de direitos humanos do período de 1946 à 1988, entretanto, nas recomendações ao Estado brasileiro, terá que analisar as violações que ocorrem nos dias de hoje para sugerir medidas que evitem a repetição, no futuro, de crimes contra os direitos humanos aos moldes da ditadura.

Rosa também assinalou o apoio que a Comissão Nacional da Verdade tem dado a medidas de preservação da memória. E lembrou das recomendações expedidas pela CNV para transformar locais de tortura e morte em centros de memória. A CNV apoia, por exemplo, o pedido da Comissão Estadual da Verdade para que o prédio onde funcionou a Auditoria Militar em São Paulo, seja transformado numa casa do advogado de presos políticos. "Locais como este, os antigos Doi-Codi, o Dops-RJ, devem ter entrada aberta ao público, para que se recordem do que ali ocorreu e que nada disso nunca mais se repita", afirmou.

 

Comissão Nacional da Verdade
Assessoria de Comunicação
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