Depoimentos permitem avançar na investigação de morte e desaparecimento em Goiás - CNV - Comissão Nacional da Verdade
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A Comissão Nacional da Verdade (CNV), órgão temporário criado pela Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, encerrou suas atividades em 10 de dezembro de 2014, com a entrega de seu Relatório Final. Esta cópia do portal da CNV é mantida pelo Centro de Referência Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional.

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Sexta, 18 de Outubro de 2013 às 20:31

Depoimentos permitem avançar na investigação de morte e desaparecimento em Goiás

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Depoimento trouxe indicação de que houve testemunha ocular da morte de Ismael Silva de Jesus; família entregou à CNV fotos de Ismael morto e o atestado de óbito

O grupo de trabalho "Graves Violações de Direitos Humanos (Mortos e Desaparecidos)", da Comissão Nacional da Verdade, esteve hoje em Goiânia (18) e colheu em sessão pública sete importantes depoimentos sobre a morte e o desaparecimento de dois estudantes secundaristas, opositores do regime militar, ocorridos em Goiás nos anos 70: o militante do PCB Ismael Silva de Jesus, "suicidado" aos 18 anos em uma dependência do Exército em Goiânia, e o integrante da Var-Palmares Marco Antônio Dias Baptista, desaparecido antes de completar 16 anos.

Segundo Daniel Lerner, gerente de projeto do GT Mortos e Desaparecidos da CNV, os testemunhos e documentos apresentados na audiência aumentaram a convicção da comissão de que Ismael foi assassinado sob tortura no 10º Batalhão de Caçadores de Goiânia (atual 42º Batalhão de Infantaria Motorizada do Exército). Além disso, os depoimentos trouxeram várias indicações de nomes e circunstâncias que permitirão à CNV avançar nas investigações de ambos os casos.

Um exemplo de contribuição à investigação do caso de Ismael foi dado pelo irmão da vítima, Paulo Silva de Jesus, o Paulinho, que trouxe documentos que ajudarão a esclarecer o caso: fotos feitas logo após a morte de Ismael, que mostram lesões de tortura.

O depoimento que chamou a atenção da CNV e de todos os presentes foi o do ex-preso político Mauro Curado Brom, que informou ter conhecido outro ex-preso político, o ex-vereador de Anápolis, Geraldo Tibúrcio, que foi colega de cela de Ismael e dizia que o rapaz morreu ao seu lado, o que desmente por completo a versão de suicídio.

Outras duas testemunhas afirmaram ter convicção que Ismael não se suicidou na cadeia. Aguinaldo Lázaro Leão servia no 10º Batalhão de Caçadores quando Ismael esteve preso. Leão era militante do PCB e amigo de infância e vizinho de bairro do preso.

Enquanto prestava seu turno de sentinela no Batalhão, Leão teve a oportunidade de falar com o amigo durante o período em que ele esteve preso. "Ele me contou que estava com o braço quebrado e que havia sido torturado, mas pediu que eu não dissesse aos pais dele todos os detalhes, pois estava preocupado com a segurança deles, caso eles fossem cobrar informações no quartel. Essa não parece ser a preocupação de alguém que fosse se matar", disse. Por conta da amizade com Ismael, o ex-soldado foi encapuzado, agredido, acareado com o amigo e reconheceu sua voz. Depois disso, ficou preso no PIC, em Brasília.

João Silva Neto, ex-vereador em Goiânia, foi preso, teve os direitos políticos cassados e foi impedido de estudar direito na UFG pelo ato 477. Ismael havia sido assessor dele (ambos eram do PCB). Durante o período em que esteve preso em Goiânia, João foi acareado com Ismael. "Eu não pude ver o Ismael, mas fui acareado com outros presos e os vi. Não permitiram que eu o visse. Isso chamou a minha atenção", disse o ex-vereador. "Minha convicção plena é a de que Ismael foi morto".

A jornalista Laurenice Noleto Alves, membro Comissão de Memória, Verdade e Justiça do Sindicato dos Jornalistas de Goiás e viúva do ex-preso político Wilmar Alves, contou que "as vítimas do 10º Batalhão sofriam muitos choques e também recebiam muitos golpes de toalha molhada na altura dos rins, que não deixavam marcas, mas lesionava os órgãos por dentro. Meu marido sofreu com problemas nefrológicos até o fim da vida", contou.

João contou também da superlotação no quartel de Goiânia, que não era preparado para receber presos. O ex-vereador não chegou a ficar numa cela no período em que esteve na capital, antes de ser transferido para o PIC, em Brasília, mas em dois banheiros. Além disso, segundo os depoimentos colhidos pela CNV em Goiânia, a tortura ocorria na sala da banda, protegida acusticamente, e na vila dos oficiais, distante dos praças e recrutas.

INDICAÇÕES – O jornalista Renato Dias e seu irmão, o engenheiro Silvino Antônio Dias Baptista, contaram que até hoje esperam novidades sobre o caso de seu irmão, Marco Antônio Dias Baptista, um dos mais jovens desaparecidos do país, preso em abril ou maio de 1970 e, desde então, nunca mais visto, antes de completar 16 anos.

O jornalista Renato Dias contou a história de militância seu irmão e as dificuldades da família em busca de informações sobre o caso. A principal testemunha foi descoberta pela família nos anos 80, o médico Laerte Chediak, irmão do delegado Ibraim Chediak, integrante da repressão. Laerte contou que Marco foi preso pelo capitão Marcos Fleury, chefe da repressão no Estado, que comandava a PF em Goiás, em maio de 1970.

Silvino Antônio Dias Baptista lembrou-se da última vez que viu o irmão, em 1970. "O Marco esteve na casa da mãe, por acaso eu estava lá e emprestei roupas para ele. Foi a última oportunidade que tive de ver meu irmão e de lá para cá sempre foi essa angústia. É sempre uma ferida aberta, mas temos a esperança que, com esse movimento causado pela Comissão seja descoberta a verdade", afirmou.

Renato e Silvino indicaram nomes de ex-militantes da VAR-Palmares e de outros presos políticos e de agentes da repressão que podem ter informações e pistas sobre o caso de Baptista. A CNV espera ouvir estas pessoas em busca de informações sobre o caso, um dos desaparecimentos menos documentados do período.

A sessão de depoimentos de hoje foi realizada em parceria com a Comissão de Memória, Verdade e Justiça do Sindicato dos Jornalistas de Goiás. Segundo o jornalista Pinheiro Salles, ex-preso político e membro da comissão dos jornalistas de Goiás, o fato de audiência ser focada em dois casos não minimiza os demais mortos, desaparecidos e presos políticos goianos. "Dentre os mortos e mortas a gente não poderia nomear quem foi mais ou menos importante. Todos foram e são importantes e a comissão fará o possível para ajudar o trabalho da CNV", afirmou.

Comissão Nacional da Verdade
Assessoria de Comunicação

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