Religiosos foram perseguidos e torturados em Minas Gerais - CNV - Comissão Nacional da Verdade
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A Comissão Nacional da Verdade (CNV), órgão temporário criado pela Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, encerrou suas atividades em 10 de dezembro de 2014, com a entrega de seu Relatório Final. Esta cópia do portal da CNV é mantida pelo Centro de Referência Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional.

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Domingo, 01 de Dezembro de 2013 às 14:17

Religiosos foram perseguidos e torturados em Minas Gerais

1469863 548446618582498 869568665 nAudiência Pública, organizada pela Comissão da Verdade em Minas Gerais (Covemg) em parceria com a CNV, ouviu 12 militantes ligados à igreja. Depoimentos comprovam que agremiações religiosas participaram da luta pelas Reformas de Base, e dossiê revela que Belo Horizonte sofreu 58 atentados de grupos da extrema-direita.

Anivaldo Padilha, coordenador do grupo de trabalho da CNV que investiga o papel das igrejas durante a ditadura, participou da mesa de abertura do evento, realizado nos últimos dias 29 e 30 de novembro no auditório da OAB, em Belo Horizonte. Ele incentivou a participação do público: "Houve no Brasil uma estrutura de repressão, e um dos objetivos da CNV é exatamente resgatar a memória deste período. Foi imposto ao Brasil o silêncio, não se podia falar sobre Ditadura. Precisamos dar espaço para que as vítimas falem, desabafem, contem a sua versão da história, e este espaço é aqui", afirmou.

Igreja x Política

Maria Zélia Castilho, ex-presa política, falou sobre a sua militância no grupo Ação Católica (AC), ligado à igreja católica. Segundo ela, a AC estava diretamente envolvida na luta pelas chamadas Reformas de Base, conjunto de mudanças econômicas, políticas e sociais propostas pelo ex-presidente João Goulart.

"O momento político era totalmente polarizado. De um lado a Ação Católica, com apoio de pessoas como Dom Helder e vários outros padres; e do outro lado a extrema direita, que reunia Opus Dei e bispos paladinos na luta contra a Reforma Agrária. Com o golpe, uma força destruidora se abateu sobre a Ação Católica, e começou um processo de desmonte do grupo. Rapidamente a sede da AC foi invadida, militantes foram presos e torturados", relatou Zélia.

Já o Frei Oswaldo Augusto, da Ordem dos Dominicanos, lembrou que o grupo era visado antes mesmo do golpe, não só pela participação na construção das Reformas de Base mas por causa do seu ativismo social. "Antes mesmo que houvesse golpe de estado já éramos visados. O aparelho de repressão, que se voltaria contra aqueles que desejavam mudanças no Brasil, já estava criado e instalado antes da ditadura. o Golpe o deu mais poder e aperfeiçoou, mas alguns padres ja haviam sido presos antes. Dez anos antes, Vargas já havia se suicidado para evitar um golpe. Em 1955, na posse de Juscelino, houve outra tentativa de golpe de estado. Em 1961, com a renúncia de Jânio Quadros, mais uma vez os militares tentaram um golpe. Foi um crime premeditado", afirmou.

Sobre aqueles que resistiram à Ditadura pela luta armada, o Frei foi bem claro: "Quando se trata de uma tirania evidente e prolongada, o direito à ressureição armada é legítimo, e equivale ao direito de legítima defesa. Não sou eu que estou dizendo, estas são palavras de São Tomás de Aquino".

Perseguição e tortura

Renato Godinho Navarro e a esposa Maria Helena de Coutinho, militantes da Ação Popular (AP), contaram histórias de sua militância política. Renato sofreu um AVC a pouco tempo, então apenas a esposa falou.

Godinho foi preso no segundo semestre de 1968, quando a polícia invadiu a igreja onde se realizava uma assembléia de metalúrgicos. Presa na Operação Bandeirantes, Helena contou detalhes sobre a tortura que sofreu.

"Fui muito torturada com choques elétricos em todo o meu corpo. Confesso que não sei como terminou a sessão, porque acordei apenas no dia seguinte, na enfermaria", afirmou Helena.

Para Apolo Lisboa, ex-preso político, uma das maiores vitórias da Ditadura foi infiltrar gente nos movimentos políticos. "Nós éramos meio ingênuos sob os métodos da polícia secreta. Um dos instrumentos mais bem sucedidos foi infiltrar pessoas no nosso meio", afirmou.

Frei Cláudio van Balen, da Igreja do Carmo, falou sobre sua militância a favor dos menos favorecidos. Nascido na Holanda, veio ao Brasil aos 16 anos de idade, na condição de seminarista.

"Éramos chamados de freis comunistas, porque a nossa igreja era a única onde todos podiam fazer reuniões livremente. Uma vez tive que depor no DOPS por causa de um folheto de missa. Diante de dois militares e um promotor, tive que explicar o que tinha escrito, e aproveitei para dar uma boa aula da catecismo para os três. Por fim me perguntaram se eu fazia aquilo todo domingo, e me pediram uma cópia da transcrição de todas as missas realizadas naquele ano", contou.

BH: capital dos atentados

Último a falar, Betinho Duarte, membro da Comissão Estadual de MG, revelou dados de um dossiê entregue à Comissão Nacional da Verdade sobre atentados terroristas promovidos por grupos de extrema direita.

"Nossa cidade foi a capital dos atentados terroristas cometidos pelos terroristas de extrema direita: CCC (Comando de Caça aos Comunistas), GAC (Grupo Anticomunista), MAC (Movimento Anticomunista) e o grupo REAÇÃO".

De 1965 a 1995, ocorreram 58 atentados terroristas, todos promovidos por grupos de extrema-direita. Para Betinho, "tortura é crime de lesa-humanidade, inafiançável e imprescritível", destacou o ex-vereador de Belo Horizonte.

Perdão

O bispo francês Michel le Ven, torturado no Brasil, fez um apelo para que a luta não seja vista de forma maniqueísta. "Não podemos demonizar ninguém, eu não quero demonizar os militares e os bispos da hierarquia. O próprio Papa Francisco teve que se explicar, porque ele não teve uma posição mais firme contra a Ditadura. O que precisamos cobrar é o nome de religiosos que ainda hoje continuam desaparecidos", destacou.

Comissão Nacional da Verdade
Assessoria de Comunicação

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